26.4.12

aquiles.

Ela tinha os calcanhares azuis.

Não tinha exatamente orgulho dos seus calcanhares, mas não escondia de si o azulado encardido, tinha consciência de ser assim e estava confortável com isso.

Uma amiga sua tinha lóbulos vermelhos, flamejantes. Escondia-os com o cabelo, em um penteado que deixava brechas para suas orelhas em chamas. Enlouquecia. Aflita, pensou em arrancar a orelha, ser Van Gogh. Mas não conseguia, e se escondia.

A de calcanhares azulados aceitava seus pés de nuvem.

Uma vez usou sandálias para um encontro com seus amigos, que olharam escandalizados. Enconda isso, disseram. Como você pode ter uma mancha colorida na pele?, uma de mindinho laranja questionou. Cegos das suas cores. Daltônicos para a humanidade.

E se viam algo estranho, um verde musgo nas costas das mãos, um lilás nas coxas, tratavam de esquecer. Passavam maquiagem, e resolvido. Até a hora do banho, ao menos.

Cabeça aberta e calcanhares à mostra, causava rebelião mental nos outros maquiados. E dessa forma incomodava, porque lembrava o arco-íris dentro de cada um. Ninguém escapa daquela aquarela que pinta as pessoas.

Não tinha medo das safiras aos seus pés. Notou que elas aos poucos desapareciam, restando só uma cicatriz do que tinham sido.

Algum dia perceberia o novo anil às suas costas. E estaria pronta para usar frente-única, não negar a cor que fazia deles humanos, a cor repudiada e cheia de camadas de pó compacto.

6.4.12

devaneios.

Será que um dia fomos todos um só? O universo inteiro em um ponto que explodiu?

Nas minhas veias corre o sangue de uma estrela?

E a vastidão do espaço.

Acho assustador de alguma forma, porque assim notamos como somos insignificantes. Somos tão pequenos, tão pequenos. Sentir isso nos diminui ainda mais. Mas fascina ao mesmo tempo.

Que nem a vida.

Será a vida produto do acaso?

Não acredito em Deus. Não acredito em um ser bondoso maior que tudo que conhecemos, manipulando tudo. Mas acho que acredito em uma força, uma energia, fazendo as coisas acontecerem.

Destino?

Não sei.

E, apesar de frustrante, essa é a beleza. Nunca vamos saber. Viajar anos-luz, salvar o mundo, ir ao infinito. Mas sempre existirão perguntas sem respostas. Sempre. O mistério nos mantém, dá a mente teorias infinitas. Eternas.

Aquela hora que a mente divaga é a hora em que tudo é verdade. Quando você sabe as mais loucas teorias, quando você engatilha mais respostas para mais perguntas e mais perguntas para ter ou não respostas.

Mas somos tão pequenos.

Somos tão grandes para as formigas. O que é o mistério para elas?

E um universo dentro de outro? Achar um planeta dentro do núcleo de um átomo? Descobrir estarmos nós em um átomo de um outro universo?

Tudo acaba?

Vamos todos ser comidos pela terra. Virar um dia outra coisa. Ser comido por uma zebra. Ser reciclado.

A única coisa para perdurar são as impressões. São suficientes para um retrato de nós mesmos? Vamos amarelar e ser esquecidos.

Mas, por enquanto, vivo.

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esse texto não foi escrito originalmente para ser publicado. é meio que pessoal. mas estava na hora de postar alguma coisa por aqui.